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Luciana Reis

Trabalhadores e pequenos empresários estão em lados opostos?


Em momentos de crise e no sistema econômico vigente, os pequenos e o micro empresários também enfrentam dificuldades, assim como o trabalhador

“Um homem se humilha se lhe castram seus sonhos. Seu sonho é a sua vida e a vida é o trabalho. E, sem o seu trabalho, um homem não tem honra, se morre, se mata, não dá para ser feliz, não dá para ser feliz.”

Trecho da música “Um homem também chora”, composta por Gonzaguinha e interpretada por Raimundo Fagner.

“O ladrão não vem senão para roubar, matar e destruir; eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância”. João 10:10

Uma notícia de julho de 2016 chamou a atenção da sociedade. O empresário Luiz Antônio Scussolino, proprietário da empresa de estofados Luizzi, em Rio Claro, no interior de São Paulo, se suicidou dias após a demissão de 20% do quadro efetivo de funcionários. A empresa passava por dificuldades devido à crise econômica, e a produção havia caído para menos de um terço, quando comparada à de dois anos antes. O proprietário entrou em depressão com os cortes de funcionários que foram feitos, e pelas tentativas sem sucesso de solucionar a situação da empresa, o que teria levado ao suicídio.

O caso não é isolado e levanta questionamentos e reflexões que se fazem necessárias quando o assunto são as relações de trabalho. Conforme o diretor de negócios e recursos humanos da empresa, Almir Santos, as demissões representaram a última saída após tentativas anteriores de solução pelo proprietário, como a proposta de diminuição da jornada de trabalho em 20%, com redução proporcional no salário. Esse é apenas um exemplo que pode ser citado, e quando não se chega a uma consequência tão dramática como esta, ainda assim temos conhecimento de tantos prejuízos e dificuldades aos trabalhadores e aos empresários.

Quando se fala em empresariado, de um modo quase automático em nossa sociedade, há a relação com a ideia dos grandes empresários, de lucros exorbitantes às empresas e assédio e cortes de direitos trabalhistas aos funcionários. O que deixa de ser compartilhado é que os micro e pequenos empresários também sofrem, com a crise econômica, com a alta carga tributária e com a preocupação em atuar assegurando os direitos de seus empregados, gerando renda para cada trabalhador e tornando o negócio sustentável a todos, financeiramente e socialmente.

Crescimento de doenças psicológicas relacionadas à crise

Os pequenos e micro empresários são explorados assim como o trabalhador, guardados as respectivas características de cada categoria. Hoje há aproximadamente 7 milhões de empresas registradas no Brasil, e a grande maioria são micro e pequenas empresas, as quais empregam 92% da população. Mais um motivo que nega a lógica que a maioria dos empresários do país visa apenas ao lucro, é rica e explora o trabalhador.

E quando analisamos as consequências das dificuldades, principalmente as relacionadas à crise, percebemos que elas estão cada vez estão mais evidentes, e de acordo com diferentes pesquisas, há uma relação entre o desemprego e as dificuldades econômicas – neste caso, seja do funcionário ou do empresário – com o aumento do número de suicídios, e de casos de depressão e distúrbios psicológicos.

Segundo o British Medical Journal, em pesquisa realizada em 2009 – após a crise econômica que atingiu diversos países em 2008 – houve um aumento no número de suicídios em países da América e da Europa. Foram quase 5 mil a mais do que o número que era projetado como o previsível no mesmo período.

O que pôde ser percebido é que o aumento ocorreu em regiões e áreas de trabalho que enfrentavam mais dificuldades relacionadas à crise. Estudos semelhantes foram feitos pela Universidade de Zurique entre 2000 e 2011, em mais de 60 países, e os resultados também apontaram que a situação econômica ou a perda de emprego têm relação com o aumento da depressão, do sentimento de impotência, o que leva, além das dificuldades financeiras, a crises em família e a sérios problemas pessoais.

Não precisamos ir muito longe, foram semelhantes os exemplos que tivemos conhecimento no Brasil, no início da década de 1990, durante o governo de Fernando Collor. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) já recomendou atenção aos distúrbios psicológicos que podem ser gerados pela crise econômica.

Como mudar?

Quando analisamos especificamente a consequência psicológica, é fundamental o apoio a ações de prevenção, o que tem relação direta com a área da saúde. Mas como inicialmente indicamos, a questão é bem mais abrangente e complexa quando envolve situações em que as relações e o modo de desenvolver as atividades em meio ao Mundo do Trabalho não são eficientes, seja para o empregador e empresário ou para o trabalhador.

A contraposição “micro e pequeno empresário x funcionário”, além de não ser saudável, já não faz sentido e não é representativa de um modelo de negócios que se sustente e que seja eficaz, seja para o crescimento do trabalhador ou da empresa.

Há a necessidade de estimular o diálogo em cada relação de trabalho, além de mudanças estruturais. É um desafio promover relações de trabalho alternativas, mantendo o trabalho dinâmico e com proteção aos empregados e empregadores. Há dificuldades inclusive relacionadas à legislação vigente, que é vista por especialistas como não atualizada conforme as novas relações de trabalho possíveis e necessárias, com a manutenção de direitos de ambos, empresário e funcionários.

O caminho para mudanças no Mundo do Trabalho passa pelos valores nos quais o Movimento Empresário Cristão se pauta, ou seja, em princípios éticos, no diálogo e em atitudes que promovam a Sociedade da Confiança. Transparência, negociação e parceria entre o trabalhador e o empresário, além de estarem relacionadas aos ensinamentos de Jesus, são as formas mais eficazes para ambos.

Quando for totalmente derrubada a ideia de que há lados opostos e conflitantes, e ficar evidente que o fundamental é promover parcerias e trabalho conjunto, com base em princípios éticos, deixando claro que o micro e pequeno empresário também tem suas dificuldades, torna-se viável uma mudança do atual cenário. As relações de trabalho deixam de ser entre opostos, e tornam-se entre semelhantes, que enfrentam diariamente desafios e dificuldades em suas atividades.

É assim que, ao mesmo tempo, também poderemos nos aproximar dos ensinamentos de Cristo, para uma vida em abundância, e encontrar alternativas para as dificuldades diárias relacionadas ao trabalho, e que foram levantadas em reflexão na música “Um homem também chora”.

Imagens: Aprenda Fácil Editora (AFE); Sintepav-CE; Reprodução/Jornal Agora

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