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Diferentes histórias, algo em comum: a fé, o amor e a perseverança

Aline Pigozzi e Luciana Reis

Os laços que unem Nossa Senhora de Fátima e Nossa Senhora Aparecida, no ano em que se comemoram suas aparições

Em um ano repleto de comemorações, por ocasião dos 100 anos das aparições em Fátima e pelos 300 anos da “pesca milagrosa” em Aparecida, surge uma curiosidade: o que pastorinhos e pescadores tiveram em comum?

Além do fato de estarem reunidos em três, há uma grande virtude: a perseverança na fé que, dada as devidas diferenças, fez com que eles mudassem o rumo de suas vidas e se tornassem porta-vozes de Nossa Senhora para o mundo.

Surgida das águas do rio Paraíba do Sul em 1717, no interior de São Paulo, aquela imagem trouxe - antes de tudo - alívio a João Alves, Felipe Pedroso e Domingos Garcia. Eles foram encarregados pela Câmara Municipal de conseguir peixes para um banquete que a Vila de Santo Antônio de Guaratinguetá iria oferecer a Dom Pedro de Almeida e Portugal, o então governador da Província de São Paulo e Minas Gerais, que visitava a região.

O que poucos sabem é que não era temporada de peixes. O que aconteceria com aqueles homens se chegassem de mãos vazias? Sabendo das represálias que poderiam sofrer, pediram a intercessão de Nossa Senhora e, nesse momento, o milagre aconteceu.

Para além desse fato, o que mais a imagem milagrosa trouxe? No contexto histórico, o Brasil vivia tempos difíceis de dominação dos portugueses e de escravidão. A Virgem Maria apareceu de um jeito único, enegrecido, mostrando que Deus não faz distinção, despertando a fé daquele povo sofrido.

Quanto aos pastorinhos, a história foi ainda mais intrigante. Em 13 de maio de 1917, as três crianças – sendo dois irmãos, Jacinta Marto (7 anos) e Francisco Marto (9 anos) e sua prima Lúcia do Santos (10 anos) – cuidavam do pastoreio após retornarem da missa em uma localidade de Fátima, Portugal. Foi então que, ao se dirigirem ao alto da Cova da Iria, tiveram a primeira visão de Nossa Senhora.

A Mãe de Deus apareceu após um clarão, que se assemelhava a um relâmpago. O pedido aos pastorinhos era que eles retornassem por seis meses ao mesmo lugar, sempre no dia 13, e que rezassem o terço pela conversão dos pecadores.

As aparições aconteceram mais cinco vezes naquele ano e, em cada uma delas, o número de fiéis aumentava e Nossa Senhora alertava sobre a necessidade da paz e da devoção ao Seu Imaculado Coração. Em julho, ela fez o anúncio do Segredo de Fátima às crianças.

O Segredo era dividido em três partes, o que se descobriu anos depois. Tratava desde a imagem do inferno ao anúncio de guerras e castigos, além da visão de mártires da Igreja Católica, identificado como anúncio do atentado que São João Paulo II sofreu também em 13 de maio, no ano de 1981.

Os acontecimentos recentes na cidade não agradaram ao Administrador da Vila Nova de Ourém, que mandou aviso aos pais dos pastorinhos para que as crianças se apresentassem às autoridades. O objetivo era descobrir o Segredo, que apenas as crianças sabiam.

Ameaças, interrogatório e três dias de prisão não diminuíram a fé e determinação dos pastorinhos, que não contaram qual era o segredo. A última aparição aconteceu em 13 de outubro, quando o “Milagre do Sol” aconteceu, para que a população acreditasse nas mensagens que haviam sido transmitidas.

Três pescadores e três pequenos pastores, de países e épocas distintas, estão entrelaçados em representação do amor, da fé e da perseverança a Nossa Senhora.

“Como é importante para nós aprendermos de Maria! Em meio às dificuldades da vida, às dores e angústias, ver além e ter um olhar de fé", ensina Papa Francisco.

A canonização das crianças e a visita do Papa

A celebração do centenário das aparições de Nossa Senhora de Fátima ficou marcada, também, por outros dois motivos: a visita do Papa Francisco à cidade portuguesa e a canonização dos pastorinhos Jacinta e Francisco.

O milagre que levou à canonização foi a cura do brasileiro Lucas, um menino do Paraná, que caiu de uma janela de mais de seis metros de altura, quando tinha cinco anos.

A recuperação de Lucas após um traumatismo craniano foi considerada um milagre e, conforme relato do pai, a família rezou pela recuperação do menino pedindo a intercessão de Nossa Senhora de Fátima, de quem são devotos, e dos irmãos pastorinhos, que haviam falecido ainda crianças, vítimas da febre espanhola.

A emoção tomou conta da cidade durante a visita, desde o desembarque do Papa, em 12 de maio, quando milhares de pessoas o acompanharam, até a celebração da canonização, que aconteceu no dia 13.

“Tantas pessoas unirem-se em volta do mesmo sentimento faz com que o sacrifício de uma longa caminhada seja recompensado. Tudo é visível no rosto emocionado das pessoas”, afirmou a portuguesa Maria Inês Leal (18 anos). “Não se consegue explicar o que se sente. É simplesmente mágico.”, completou.

Maria Inês mora no distrito de Leiria, bem próximo de Fátima e relata que o centenário das aparições tem um significado maior aliando-se à canonização dos pastorinhos. “A vinda do Papa Francisco veio completar tudo. Até mesmo quem não é católico pode perceber algo diferente”, enfatizou.

Padre Elinaldo Ferreira de Oliveira, da Paróquia São Benedito, na Vila Sônia, bairro da zona oeste de São Paulo, também esteve na comemoração e relembrou os momentos do Papa: seu profundo silêncio na capelinha da Cova da Iria e a ternura com que se colocou nesse momento, atualizando a mensagem contada em Fátima. Confira alguns trechos da entrevista entre a equipe do Empresário Cristão e o pároco.

EC: Como a população em Fátima reagiu às festividades?

Pe. E: A população de Fátima, como todo o povo português, peregrinos de tantas nações que ali ocorreram, creio que viram um tempo de graça. Deu para sentir como o centenário foi muito bem preparado, com várias iniciativas.

EC: Os três pastorzinhos foram perseguidos, presos e chamados de mentirosos. Isso não é uma forma de martírio, já que eles eram apenas crianças?

Pe. E: A Igreja foi sempre prudente no tocante às aparições e aos fenômenos religiosos. É muito bom, pois ajuda e muito no processo de discernimento para atestar e reconhecer tais fenômenos. Então, não só nos pastorinhos de Fátima, mas em todas as aparições marianas reconhecidas oficialmente, creio que o fator ‘sofrimento’ acaba diretamente fazendo parte do processo. Eram crianças, camponeses, pobres, iletrados. Como disse Papa Francisco, “eles são santos pelo testemunho da fé e fidelidade à mensagem dirigida através deles: Francisco, Jacinta e Lucia”.

EC: E, mesmo assim, eles permaneceram firmes em seus testemunhos, a ponto de se tornarem os santos mais jovens. O que isso representa para igreja e para o mundo?

Pe. E:Significa que Deus é simples. Sua mensagem se dirige aos pequenos, pobres e fracos. Vede o Magnificat!

EC: Há relação entre a história de aparição de Nossa Senhora de Fátima com Nossa Senhora Aparecida?

Pe. E: É sempre Maria, Mãe de Jesus e nossa Mãe. Como afirmou Beato Paulo VI, “o rosto materno de Deus”. Em Aparecida, para dizer que o Pai nos quer amado, quer a vida plena em abundância para todos. Em Fátima, apelo de paz, de conversão e comprometimento, escuta e vivência do Evangelho.

EC: Como o senhor vê o milagre depositado a Francisco e Jacinta vir de uma criança do Brasil, levando em consideração a relação histórica entre Brasil e Portugal?

Pe. E: História de Brasil e Portugal – explorados e exploradores. Um caminho percorrido por libertação. É o reconhecimento de que nenhum povo deve subjugar-se ao outro. É como disse Papa Francisco: “crianças pequenas com a força revolucionária do amor e intercessão de Maria. Temos mãe!”.

EC: Será que, pelos pescadores não terem sofrido as mesmas perseguições pelas quais passaram os pastorzinhos, a aceitação da devoção à Nossa Senhora tenha sido mais fácil no Brasil?

Pe. E: No Brasil império, escravidão, a imagem encontrada permaneceu muito tempo com os pescadores, entre os simples. A Igreja, instituição, entra bem depois reconhecendo e acolhendo a mensagem de Aparecida.

EC: O que Nossa Senhora Aparecida representa para o Brasil?

Pe. E: Nossa Senhora, a imagem negra encontrada nas águas do Rio Paraíba do Sul, é expressão forte da presença de Jesus, como lá nas Bodas de Caná. A hora de Jesus chegou, a vida é sagrada, fartura dos bens para todos!

EC: Qual é a expectativa do clero para comemoração dos 300 anos da aparição de Nossa Senhora Aparecida?

Pe. E: Não só a hierarquia, mas todo o povo católico já está vivenciando o ano jubilar. Exemplo: em todas as Dioceses brasileiras, a réplica de Nossa Senhora tem percorrido diferentes regiões do país. E colhendo os frutos dessa peregrinação.

EC: O senhor acompanha se ainda há possibilidades de o Papa participar das comemorações? Ele havia prometido na ocasião de sua visita à Basílica.

Pe. E: Todos sabem como Papa Francisco é um grande peregrino e nos anima a ser uma igreja em estado permanente de missão, indo às periferias geográficas e existenciais da humanidade anunciar a misericórdia, a compaixão. Ele pede e dá o exemplo. Sua agenda é apertada, a idade vai chegando, sua saúde é frágil. Porém, esse homem é um gigante. Compreendo que ficará para outro momento o retorno dele por aqui. Uma vez que, como arcebispo de Buenos Aires e grande colaborador, esteve na Conferência de Aparecida. E já como Pontífice, sua primeira Viagem Apostólica Missionária foi ao Brasil e se fez presente em Aparecida. Logo, deixemos o Papa caminhar e levar a todos a alegria do Evangelho.

EC: O que significa arriscar tudo em nome da fé?

Pe. E: Apostar tudo naquele que é fiel e como o apóstolo São Paulo, poder afirmar “Sei em quem coloquei minha confiança. Tudo posso naquele que me fortalece!”.

Referências:

“História dos Três Pastorinhos”. Pe. Januário dos Santos. Editorial Missões Cucujães – 2000.

http://observador.pt/especiais/pastorinhos-de-fatima-estava-de-olho-neste-milagre-ha-quatro-anos/

https://pt.aleteia.org/2016/09/15/na-integra-as-tres-partes-do-segredo-de-fatima-e-uma-interpretacao/

http://g1.globo.com/pr/oeste-sudoeste/noticia/apos-canonizacao-dos-pastorinhos-de-fatima-menino-lucas-retorna-ao-brasil.ghtml

Imagens:

Arquidiocese de São Paulo; Redação A12; Felipe Dana/AP; O Anunciador; Fátima Arautos; Blog Canção Nova; José Sena Goulão/Reuters


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