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  • Michele Diniz

O Brasil não quer e não pode parar tudo.

Updated: Apr 7, 2020

Maio de 2006, São Paulo, a manchete no jornal era “Pânico no Galinheiro”. Com essa frase na cabeça e apavorado, Landi Dantas, 55, saiu para buscar tampas de shampoo para aplicar um processo de decoração de embalagens chamado hot-stamping, o qual realiza até hoje. Na época, sua empresa era recém aberta, tinha apenas dois funcionários e ele passava por grande dificuldade financeira e já não tinha esperança de conseguir dinheiro emprestado no banco. Era movido pela fé e lutava para não deixar faltar comida em casa e o salário dos funcionários. Naquele mês, São Paulo foi submetida à um toque de recolher imposto por criminosos de uma conhecida facção local. A cidade que nunca para, parou. No caminho, em direção ao Capão Redondo, Landi observou uma moto vindo ao seu lado, percebeu que um dos ocupantes mexia em um pacote e viu que ali havia uma arma de fogo. O carona da moto percebeu, o olhou fixamente e o pânico tomou conta dele. Eles pararam a cerca de 200 metros de seu carro. Landi, temendo ser alvejado, pensou: "vou morrer se continuar andando na rua, mas não posso voltar para casa, preciso do meu trabalho". Não tinha outro jeito, ou ele pegava as tampas, trabalhava e ganhava o dinheiro do mês ou deixava a empresa quebrar e sua família e funcionários desamparados. Com esperança de sair dali vivo, jogou o carro na contramão e seguiu pela primeira rua que apareceu. Após tomar certa distância, parou e se pôs à rezar. Por alguma razão, os criminosos não o perseguiram.

O texto no jornal aquele dia falava sobre povos que passam por guerras e calamidades e mesmo sob as condições mais difíceis continuam trabalhando. Quantos brasileiros saem pela manhã em meio à tiroteios e precisam seguir adiante? Não somos um povo covarde, mas quando somos submetidos à uma carga imensa de informações sem capacidade de filtrá-las podemos errar o caminho. A certeza que ficou foi de que as autoridades governamentais erraram na condução da crise de 2006, milhões de pessoas pararam pelo pânico.

Estamos diante de uma iminente tragédia. O novo coronavírus está deixando os brasileiros apreensivos e estamos agora confinados em nossas casas para proteger à nós e aos mais vulneráveis, especialmente os idosos. Milhões de pequenos empresários, profissionais liberais e autônomos estão neste momento na mesma situação em que Landi estava em 2006, sabem que trabalham ou quebram. Os trabalhadores também estão preocupados, pois cada vez mais estão tomando ciência de que seus empregadores não conseguirão os manter em casa sem que isso tenha sérias consequências. Temem perder seus empregos e o sustento de suas famílias. O governo e as autoridades estão empenhadas na busca por alternativas, porém podemos observar que a política, como forma de diálogo para resolver os problemas, não está sendo exercida guiada pelos princípios da paz e do diálogo, e temos que tomar este caminho. Precisamos lutar pela vida com todas as nossas forças, mas sem trabalho, ali na frente, não haverá sonhos, nem honra, e muitas vidas podem ser perdidas.

O Presidente Jair Bolsonaro tem razão em se preocupar com os empregos, e parte da população tem manifestado desejo de voltar ao trabalho, tomando as medidas necessárias de prevenção, obviamente. Está fazendo carreatas e subindo hashtags como a “o Brasil não pode parar ”. O custo em vidas por falta de trabalho, no modelo atual de distanciamento social, pode ser muito maior do que os causados pelo vírus. E não será com dinheiro de empréstimo bancário que os pequenos sobreviverão, pois a verdade é que maioria não será atendida pelos comitês de crédito citados recentemente por um secretário de governo.

Buzinaço em Blumenau, Santa Catarina. (Foto:Alexandre Dávila, arquivo pessoal/Imagem retirada do site Nsc Total)

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