top of page
  • Aline Pigozzi

O que a Virgem Maria faz na história do Islamismo?


A relação histórica entre cristãos e muçulmanos e a busca pela paz

Espantosa. Essa é a reação da maioria das pessoas que tomam conhecimento sobre um afetuoso sentimento que os muçulmanos nutrem por Nossa Senhora. É isso mesmo! O Islamismo, religião predominante no Oriente Médio, diverge quase que integralmente do Cristianismo, exceto pelo respeito à Mãe de Jesus.

No Alcorão, livro sagrado do Islã, Maria é a única mulher citada e exaltada em um capítulo inteiro (Sura 19, intitulada “Maryam”). “Para os muçulmanos, não há uma mulher perfeita se não Maria”, afirma Padre Aquilino Castillo Alvarez, do Convento Franciscano de Harissa, no Líbano.

Padre Aquilino, do Santuário Nossa Senhora do Líbano, é testemunha de uma realidade pouco conhecida e, no mínimo, intrigante: cristãos e muçulmanos dividem o mesmo espaço em veneração à Virgem Maria. “Todos os dias, entre 10 e 15 ônibus de visitantes muçulmanos chegam de muitos países do Oriente Médio”, completa o padre.

Devido a isso, o Líbano decretou o feriado nacional de 25 de março. Uma festa islamo-cristã que acontece desde 2010, consagrado à Anunciação da Virgem Maria.

A religião islâmica

É bem verdade que as menções à Maria no Alcorão são muito devotas e piedosas. No entanto, é preciso olhar com cautela para essa relação, uma vez que as duas crenças não convergem entre si. Mas, ainda assim, é considerada por muitos estudiosos como uma porta de entrada para o diálogo inter-religioso.

Segundo o Alcorão, Maria foi concebida sem pecado e livre de todas as máculas. Desde a infância, foi criada pelo tio e cercada de privilégios celestes. Ficou grávida por ordem de Deus e seu Filho Jesus, considerado um grande profeta, nasceu já falando desde o berço.

Apesar da orientação dada pelo livro sagrado, a devoção a Nossa Senhora é mais praticada, na realidade, pelo Islamismo popular (aquele das mães, das famílias e dos muçulmanos menos praticantes), do que pelos sheiks árabes e aqueles que desempenham papel no Islã formal.

O Islamismo, por sua vez, teve seu início com o profeta Maomé (Mohammad), no século VII, com influências do Cristianismo, do Judaísmo e de costumes da Arábia. A tradição islã diz que Maomé foi o último dos profetas na Terra, escolhido para receber as verdadeiras interpretações sobre as Escrituras, uma vez que as outras duas religiões teriam distorcido as revelações de Deus.

Interpretações essas que, aos olhos cristãos, são heréticas e condenadas pela Igreja. Entre elas, a negação da Divindade de Jesus, de Sua morte na cruz, da Santíssima Trindade e a afirmação de que Deus é único, não é Pai e não tem Filho.

O olhar da história

Padre Alessandro Carvalho de Faria, pároco da Paróquia São Francisco e Santo Estevão, localizada no Campo Limpo, é formado em Ciências Sociais e Cultura Árabe pela Universidade de São Paulo e faz uma análise, a título pessoal, sobre o contexto mundial pós-islâmico.

O primeiro grande problema apontado pelo padre é a falta de unidade na religião. No Islã, não existe autoridade comum ou doutrina uniforme. Existem inúmeras comunidades que vão praticar sua fé de modos diferentes, baseados na ideia de submissão, que é a essência do Islamismo.

“Para eles, tudo vale em nome da obediência a Deus. Então, como distinguir quem é radical ou moderado? A falta de liderança orgânica nos deixa sem saber como se posicionar”, analisa o estudioso que se considera mais conservador do que a própria Igreja.

A segunda questão é a rápida expansão do Islamismo ao redor do mundo, que acontecia por meio da Jihād (guerra santa) – ideia extremista de conversão mediante o uso da força de armas. “Quando eles ganhavam uma batalha, os moradores daquela localidade precisavam escolher entre se tornar muçulmanos; continuar com sua religião, mas pagar imposto sobre isso; ou deixar a sua terra, caso contrário, seriam mortos”, explica Padre Alessandro.

Essa prática muçulmana mudou a distribuição populacional dos países desde o século VII, tendo seu ápice no século XX. Grandes guerras resultaram em invasões de território, redução de nações, expulsão de povos, imigração do Oriente Médio e do Norte da África para outros continentes, entre outras consequências.

Portanto, segundo o padre, “a convivência não é e nunca foi fácil, pelo contrário, raros foram os períodos de paz. A intenção de um feriado é muito bonita, mas não é o que vai resolver o problema”.

Sobre a proximidade de cristãos e muçulmanos pela fé em Nossa Senhora, Padre Alessandro é muito enfático. Para ele é irrelevante, já que as grandes autoridades não a praticam, mas a condenam. Haja vista quando há conflitos no Oriente e as regras de civilidade se rompem, dando início a uma série de profanações nas Igrejas.

A busca pelo diálogo

É certo que, a princípio, todo esse contexto histórico afasta qualquer possibilidade de harmonia entre Cristianismo e Islamismo. No entanto, é possível ver alguns esforços que despontam em busca de paz, como o feriado islamo-cristão no Líbano; os templos marianos que recebem as duas religiões e a abertura para o diálogo inter-religioso proposto pelo Concílio Vaticano II.

Segundo o Concílio, os muçulmanos devem ser olhados com carinho pelos cristãos, uma vez que eles participam da mesma promessa feita a Abraão na grande descendência mencionada em Gênesis, no Antigo Testamento.

Contudo, Padre Alessandro ressalta: “O que nos une não é suficiente para conversar com os radicais.

Não os convenceu a baixar as armas. Então, até que ponto isso é algo positivo ou razoável?”.

Já Papa Francisco, que desde o início de seu Pontificado tem se esforçado para ampliar este diálogo com o povo muçulmano, afirma que só com o respeito recíproco se chega a uma amizade sincera e duradoura.

Imagens:

www.aleteia.org

www.ohmyindia.com

www.mts.org.br

www.religiao.culturamix.com


221 views
bottom of page